#005 - terra de ninguém
a internet virou terra de ninguém. as vezes não sei se sinto mais medo dentro ou fora dela. com todas as coisas que aconteceram nas últimas semanas, principalmente com o movimento #vidasnegrasimportam, fiquei questionando muito a maneira como a gente tem se comportado nas redes sociais.
vi muitas pessoas se posicionando de maneira vazia só pra que ficasse registrado de que “lado” elas estão e outras que gostariam de iniciar alguma forma de diálogo sem saber como fazer isso de um jeito que elas não fossem canceladas e mal interpretadas.
há pouco tempo começamos a ler e ouvir a palavra “recorte” em tudo que é lugar. sabe quando você quer dizer que essa é a sua bagagem ou a sua história? recorte é isso! mas, diferente do que essa palavra propõe, eu sinto que o que a gente vê é um grande bloco de opiniões iguais e generalizadas que nunca levam em consideração nenhum recorte.
depois que decidimos vir passar a quarentena na casa dos meus pais - que está sendo maravilhoso - a gente teve a oportunidade de entrar em contato com histórias e realidades diferentes do nosso dia-a-dia. outros recortes. e eu comecei a perceber como é fácil a gente cair na armadilha de julgar tudo exclusivamente pelo nosso próprio ponto de vista.
nossa realidade e crenças se tornam maiores do que qualquer outra coisa e fica quase que impossível olhar pro outro e ver o mundo por meio dos olhos dele.
e cada dia que passa a gente se arma mais, já que a internet nos obriga a fazer isso. como temos tudo que é informação literalmente na palma da mão, é sua obrigação saber tudo que está acontecendo, entender de todas as pautas e, principalmente, ter um posicionamento com relação a todas elas.
antes que essa carta gere qualquer tipo de confusão pra você, não estou dizendo isso com relação a toda discussão sobre racismo que tem acontecido nas últimas semanas. acho ela mais do que necessária e, inclusive, tardia. a gente tinha que ter falado sobre tudo isso há muito tempo! todos os temas levantados são extremamente importante de serem olhados. se tem alguém dizendo que sente algum tipo de dor, ela deve ser validada.
o que eu quero dizer é que eu sinto que muitas pessoas tem medo de compartilhar suas dúvidas e eu tenho certeza que tem muitas delas são incrivelmente básicas sobre tudo que é tipo de coisa, mas você nunca vai abrir uma conversa dessa no seu instagram. é mais fácil esperar um almoço de domingo - ou uma videochamada - com aquele primo desconstruído e rei do twitter pra você perguntar. ele não vai te cancelar - talvez.
tenho sentido que os posicionamentos e falas tem sido cada vez mais vazios e feitos pra que estejam dentro daquilo que é esperado dessas pessoas, porque hoje não existe espaço na internet para que a gente cometa erros. e quando você rola seu feed você começa a ver uma plasticidade gigantesca. tá tudo muito igual.
não tem como falar de profundidade num mundo que pessoas podem ser canceladas - as vezes fico pensando que nossos netos vão rir muito dessa cultura que temos. pra ter profundidade é necessário falar merda, se ouvir, repensar, se desculpar, corrigir e repetir esse ciclo até a vida acabar.
onde não tem espaço pra erro não tem espaço pra crescimento.
desculpa o desabafo. são 2:15 da manhã e tudo isso saiu quase que num vômito. tô processando isso há dias e precisava dividir com você. sinto que aqui eu tenho espaço pra errar.
espero que você erre bastante. quanto mais rápido você errar, mais perto você está de encontrar o acerto.
com amor,
Lari.